O TIMING CERTO PARA ATACAR A QUESTÃO DO CORTE AOS SUBSÍDIOS AOS COMBUSTÍVEIS

Artigo de opinião sobre o corte aos subsídios aos combustíveis.

Filomeno Manaças 

Após vários anos a amadurecer a ideia, o Governo decidiu eliminar, a partir de sexta-feira (02.06) e de forma gradual, os subsídios aos combustíveis, começando com um corte parcial na gasolina, que passou, a partir dessa data, a ser comercializada ao preço de 300 kwanzas o litro, contra os 160 anteriores.

A política de subsídios aos combustíveis tem sido assunto bastante discutido entre os economistas. Os ângulos de abordagem variam. Aquando da implementação do Plano de Estabilização Macroeconómica, em 2018, já vozes se levantavam a pedir a eliminação dos subsídios aos combustíveis. 

Porém, num contexto em que a economia estava a ser submetida a várias medidas de choque, com alterações substanciais nas políticas monetária e cambial, mexer nos subsídios aos combustíveis seria o suicídio das reformas, que estavam no seu início e recomendavam, tendo em conta a estrutura da economia angolana, que não se desse um passo maior que a perna. 

Por a sua aplicação ser, até então, generalizada, os mais críticos sempre defenderam a sua retirada, também total, de modo a deixar espaço para que o mercado reflectisse o preço real da commoditie. O argumento principal era (e é) que o Estado perd(e)ia grandes somas em dinheiro, que poderiam ser canalizadas para implementar projectos de carácter económico e social com forte impacto nas populações. Além de que – sempre se realçou esse detalhe -, os subsídios aos combustíveis beneficiavam mais as pessoas com maior rendimento. Subsídios aos combustíveis uma faca de dois gumes: se, por um lado, o Estado passava a ter mais receitas à sua disposição para fazer face a encargos, por outro, expunha-se ao risco de uma medida do género poder despoletar uma escalada dos preços, com efeitos sociais negativos, sobretudo sobre os mais vulneráveis. 

Na ponderação das duas situações e de modo a não prejudicar os mais desfavorecidos, o Executivo decidiu por bem efectuar, a partir do dia 02.06, apenas um corte parcial nos subsídios para a gasolina, salvaguardando vários aspectos. Entre esses, destaque para o facto de que o novo preço da gasolina não abrange os táxis e moto-táxis, bem como o sector produtivo (agricultura, pescas, indústria, entre outras áreas), que vão continuar a beneficiar da subvenção do Estado. Por esta medida inicial só afectar a gasolina, os outros derivados do petróleo, como o gasóleo, o petróleo iluminante e o gás de cozinha, vão manter os preços actuais. Entretanto, o Executivo anunciou que o processo de corte parcial dos subsídios aos combustíveis vai decorrer até 2025. 

Espera-se que, nesse ano, se atinja a eliminação total da subvenção da gasolina e do gasóleo. Dados indicam que entre 2020 e 2022 o Estado gastou 3.5 biliões de kwanzas com subvenção aos combustíveis. Falando em dólares são apontados números que se situam entre 3 e 4 mil milhões por ano (entre 2.8 e 3.7 mil milhões de euros/ano). Contas feitas e de acordo com a ministra das Finanças, Vera Daves, a subida gradual do preço da gasolina permitirá ao Estado poupar 400 mil milhões de kwanzas entre 2023 e 2024, representando um peso de 40 por cento nas subvenções aos combustíveis. 

O Executivo adoptou, portanto, uma política de retirada gradual dos subsídios e escolheu um timing para a sua implementação que lhe vai permitir ir monitorizando a execução das medidas e os seus efeitos, numa abordagem que lhe confere margem para ir fazendo, se necessário, ajustamentos pontuais, de modo a que os resultados sejam os esperados: a dinamização da economia e a manutenção da estabilidade social. 

Não é estranho que, algumas semanas antes do anúncio e da entrada em vigor do corte parcial do subsídio à gasolina, o preço do arroz tenha registado uma subida significativa nas superfícies que comercializam o produto a grosso. Sendo uma economia fortemente sujeita ao fenómeno especulativo, uma medida radical de corte das subvenções seria o pretexto para uma subida generalizada dos preços de bens e serviços, de acordo com a visão clássica de repasse ao consumidor dos custos. 

Para um Executivo com um mandato (2022-27) com sérios desafios no plano político e económico e em que a conjuntura internacional não ajuda (a guerra na Ucrânia está a sacudir o sistema financeiro mundial, os preços do petróleo estão a recuar e é preciso não esquecer os efeitos da pandemia da Covid-19), o período 2023-25 é o timing certo para a implementação de uma medida que vinha sendo adiada por razões óbvias. A complexidade da questão, a necessidade de dosear a sua implementação e a escolha do momento oportuno foram factores que condicionaram a tomada da decisão política de se avançar com o processo. 

Do ponto de vista económico e social espera-se que os choques resultantes da sua aplicação estejam inteiramente absorvidos em 2026 e 2027, e que os agentes económicos e os consumidores tenham feito já a necessária maturação da nova realidade.

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